Medicina / Ciências Médicas e da Saúde

Dissertações de Mestrado

 

Avaliação ecocardiográfica experimental no coelho e sua aplicação em investigação biomédica

 

Autor: Cláudia Maria Caldas Moura Bento
Orientador:
Adelino F. Leite-Moreira, José Carlos Areias

 

Mestrado em Medicina e Oncologia Molecular

Faculdade de Medicina

Universidade do Porto
 

 

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Avaliação ecocardiográfica experimental no coelho e sua aplicação em investigação biomédica

Resumo

Introdução: A ecocardiografia é actualmente uma técnica de diagnóstico indispensável na abordagem do doente com suspeita de doença cardíaca, em qualquer grupo etário. Tradicionalmente a avaliação da função diastólica do VE é efectuada com base no padrão de fluxo através da válvula mitral. Contudo, este estudo apresenta limitações relacionadas com a dependência de volume, dependência da idade, localização anatómica da amostra de volume do Doppler, ritmo e frequência cardíaca. Mais recentemente a imagem por Doppler tecidular (IDT) veio melhorar significativamente a avaliação não invasiva da função diastólica e sistólica ventricular. O índice de Tei (IT) é um parâmetro ecocardiográfico que tem sido alvo de uma aplicação crescente na avaliação da função sistólica e diastólica no humano com doença cardíaca congénita ou adquirida. A principal vantagem deste índice prende-se com o facto de não ser dependente da idade ou da frequência cardíaca, bem como da geometria ventricular.

Objectivos: Primeiramente, com os dois trabalhos iniciais, pretendeu-se determinar os valores ecocardiográficos de referência, por modo-M (MM), Doppler pulsado (DP) e IDT, para o coelho branco neo-zelandês (Oryctolagus cuniculus) (estudos nº1 e nº2). Posteriormente foi avaliada a concordância absoluta entre a avaliação do IT efectuada por três técnicas ecocardiográficas diferentes (estudo nº 3). Numa última fase, foi nosso objectivo avaliar as alterações ecocardiográficas observadas num modelo experimental na insuficiência cardíaca (IC) induzida pela doxorrubicina (DOX) (estudos nº 4 e nº 5).

Métodos: Os animais foram sujeitos a uma anestesia ligeira recorrendo a dois protocolos diferentes: cetamina e medetomidina (estudos nº 1, nº4 e nº5) e cetamina e midazolam (estudos nº 2 e nº3). O modelo experimental de toxicidade da DOX foi utilizado para a indução de IC. Todos os animais foram submetidos a ecocardiografia transtorácica standard em modo bidimensional, MM, DP e Doppler codificado em cor. Adicionalmente foi efectuada uma avaliação por IDT do anel mitral, nos animais que integram os trabalhos nº 2 e 3. Os estudos foram efectuados a partir das projecções paraesternal direita e esquerda e apical de quatro e cinco câmaras, utilizando um ecocardiógrafo Aloka Color Doppler SSD-2200 (Aloka Co, Japão), GE Vivid 3 (GE VingMed, GE, Portugal) ou GE Vivid 7 (GE VingMed, GE, Portugal) equipado com uma sonda sectorial de frequência variável (3,5-7,5 MHz). Todas as medições foram realizadas em simultâneo com monitorização electrocardiográfica com sweep speed de 100 e 200 mm/seg e gravadas em software próprio para análise posterior. Para cada parâmetro foram efectuadas três medições e a respectiva média.

Resultados: Os autores documentaram os valores ecocardiográficos de referência no coelho branco neo-zelandês saudável, anestesiado com a combinação cetamina e medetomidina. Esta combinação permitiu uma boa imobilização do animal e a aquisição de imagem ecocardiográfica com qualidade. Por outro lado, o tempo de recuperação foi curto uma vez que os efeitos da medetomidina podem ser revertidos com atipamezol. Posteriormente, e sob anestesia com a associação cetamina e midazolam, a avaliação ecocardiográfica basal foi complementada com dados referentes a IDT. Verificámos que os nossos resultados estavam em concordância com estudos previamente efectuados nesta espécie animal, e que verificaram um aumento da frequência cardíaca associada a esta combinação anestésica. O valor do IT do ventrículo esquerdo (ITVE) calculado pelas técnicas MM, DP e IDT septal e parede lateral do VE, expresso em média ± desvio-padrão, foi respectivamente 0,27 ± 0,15; 0,59 ± 0,10; 0,67 ± 0,23 e 0,64 ± 0,14. Relativamente ao componente a do ITVE obtido pelas três técnicas ecocardiográficas (MM, DP, IDT septal e lateral), os coeficientes de correlação de Pearson foram elevados (³0,7) e estatisticamente significativos. Contudo, apenas a IDT septal e a IDT lateral apresentaram uma boa concordância (CIC=0,86). No que respeita ao valor do componente b obtido pelas três técnicas ecocardiográficas as correlações foram globalmente baixas, com excepção para a observada entre a IDT septal e lateral. De forma semelhante ao observado para o valor de a, apenas as técnicas de IDT apresentaram uma boa concordância entre si (CIC=0,77). Para o ITVE apenas as técnicas de IDT mostraram uma correlação positiva significativa. Todas as outras correlações foram próximas de zero com uma correlação negativa moderada e paradoxal entre as técnicas ITVE-DP e ITVE-IDT lateral. Para o ITVE a concordância absoluta foi fraca para todas as técnicas. Os trabalhos nº 4 e 5 pretenderam avaliar as alterações ecocardiográficas observadas num modelo experimental na IC induzida pela DOX. No primeiro destes estudos verificámos, no grupo de animais com IC induzida pela DOX, um aumento progressivo do diâmetro telediastólico (14,3 ± 0,8 mm para 15,6 ± 0,4 mm) e do diâmetro telessistólico (10,4 ± 0,3 mm para 11,7 ± 0,4 mm). Adicionalmente foi observada uma redução da fracção de ejecção (FEj) (61,1 ± 1% para 52 ± 2%) e da fracção de encurtamento (FE) do VE (30 ± 1% para 24 ± 1%). De forma semelhante, no segundo trabalho deste grupo, constatámos um aumento progressivo do diâmetro telediastólico (14,2 ± 0,3 mm para 15,2 ± 0,3 mm) e do diâmetro telessistólico (9,9 ± 0,2 mm para 11,1 ± 0,3 mm), bem como uma redução da FEj (64 ± 1% para 56 ± 2%) e da FE do VE (32 ± 1% para 26 ± 1%) nos animais com IC induzida pela DOX. De uma forma consistente estes resultados ecocardiográficos estavam concordantes com a existência de cardiomiopatia dilatada.

Discussão e Conclusões: Em conjunto, as várias técnicas ecocardiogáficas complementam-se e estabelecem a ecocardiografia como um meio de diagnóstico, não invasivo, seguro e extremamente útil na avaliação da (dis)função cardíaca. O coelho neo-zelandês constitui um modelo experimental de grande importância em investigação cardiovascular. Uma vez constatada a inexistência, na literatura, de valores ecocardiográficos de referência para esta espécie animal, os dois primeiros trabalhos consistiram na aquisição e caracterização destes mesmos valores. Na prática clínica é importante definir (dis)função cardíaca por metodologias técnicamente simples mas igualmente fidedignas. É igualmente indispensável definir se é indiferente calcular o ITVE por técnicas ecocardiográficas distintas. Dado que a análise do ITVE é morosa, na prática diária não é possível nem exequível o cálculo deste índice de performance miocárdica por todas as metodologias ecocardiográficas. Perante a inexistência de informação relativa a uma avaliação estatística que estabeleça de uma forma mais precisa a relação e a concordância entre diferentes metodologias ecocardiográficas, foi nosso objectivo a avaliação da concordância entre diferentes técnicas ecocardiográficas para cálculo do ITVE. Os nossos resultados evidenciaram que para o ITVE apenas as técnicas IDT apresentaram uma correlação significativamente positiva. Todas as outras correlações foram próximas de zero com uma correlação negativa moderada e paradoxal entre as técnicas ITVE-DP e ITVE-IDT lateral. Para o ITVE a concordância absoluta foi fraca para todas as técnicas. As diferenças observadas nos valores do ITVE, calculado mediante técnicas ecocardiográficas diferentes, são provavelmente atribuídas a diversos potenciais factores de erro cumulativos e que poderão assim explicar a má concordância absoluta observada entre as técnicas. Deste modo, a comparação dos valores do ITVE obtidos por técnicas ecocardiográficas diferentes deverá ser interpretada de forma cautelosa. De todas as técnicas ecocardiográficas, o cálculo do ITVE por IDT será provavelmente o mais preciso, uma vez que ambos os componentes da fórmula são avaliados necessariamente no mesmo ciclo cardíaco. Os trabalhos nº 4 e 5 preconizaram avaliar as alterações ecocardiográficas observadas num modelo experimental na IC induzida pela doxorrubicina. Estas avaliações inseriram-se num estudo que estava a ser desenvolvido pelo nosso grupo relacionado com a modulação da função miocárdica pela ET-1, tendo sido nossa função a avaliação ecocardiográfica sequencial dos animais nos quais foi induzida a IC. Pudemos verificar um aumento progressivo dos diâmetros telediastólico e telessistólico, bem como uma redução da FEj e FE do VE. Estes resultados ecocardiográficos estão de acordo com os resultados de trabalhos experimentais e clínicos, no contexto da cardiomiopatia dilatada. A ecocardiografia constitui uma técnica preciosa na monitorização não invasiva de alterações morfológicas e funcionais associadas à progressão para a disfunção cardíaca.

 

Índice

I – Introdução                                                                                                                

Propriedades Diastólicas do Ventrículo Esquerdo

Propriedades Sistólicas do Ventrículo Esquerdo

Fisiopatologia da Insuficiência Cardíaca

Avaliação Ecocardiográfica por Doppler da Função Diastólica

Influxo da Válvula Mitral

Fluxo Venoso Pulmonar

Tempo de Relaxamento Isovolumétrico                                                             

Avaliação Ecocardiográfica da Função Sistólica

Fracção de Encurtamento

Fracção de Ejecção

Velocidade de Encurtamento Circunferencial das Fibras

Intervalos de Tempo Sistólicos

Imagem por Doppler Tecidular

Avaliação da função diastólica por Imagem por Doppler Tecidular

Avaliação da função sistólica por Imagem por Doppler Tecidular

Aspectos Fisiopatológicos, Clínicos e de Prognóstico na Miocardiopatia                      

Dilatada Induzida pela Doxorrubicina

Modelo Animal de Doença – Miocardiopatia Dilatada Induzida pela Doxorrubicina

II – Objectivos                                                                                                               

III – Metodologia                                                                                                          

Modelo Experimental

Avaliação Ecocardiográfica

IV – Determinação dos Valores Ecocardiográficos de Referência no Coelho Adulto Neo-zelandês

V – Avaliação da Concordância entre Técnicas Ecocardiográficas no Cálculo do Índice de Tei  no Ventrículo Esquerdo

VI – Avaliação Ecocardiográfica da Disfunção Cardíaca Induzida pela Doxorrubicina

VII – Discussão                                                                                                           

VIII – Conclusões                                                                                                       

IX – Perspectivas Futuras                                                                                         

X – Referências       

 

 

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